terça-feira, 30 de maio de 2023

Quero a revolução

Aborrece-me tremendamente o estado das coisas
Esta névoa enjoativa de fumo que paira na cidade
Estes asfixiantes aglomerados de betão e vidro
A rotina insuportável de ir para o trabalho de manhã
Encontrar as mesmas pessoas insípidas do dia anterior
E os carros, sobretudo os carros, em todo o lado, os carros

Mais as notícias cada vez mais defuntas da televisão
O eterno comentário do comentário da frase que ninguém sabe quem disse
Até os melhores políticos, os filósofos, os artistas estão todos enterrados no mesmo quintal
E a repetição, a repetição infinita é um transtorno: repitam, corujas, repitam
Ninguém vos está a ouvir. Absolutamente ninguém

Quero a revolução, não pelo preço das casas, não pelo preço do pão.
Não para esmagar bafientos fascistas, que bem merecem. 
Não pela emancipação das massas. Não para salvar o povo do capital. 
Não para libertar as mulheres. Não para para aniquilar os rentistas.
Não para acabar com a finança, a especulação e a dívida.
Não para salvar todas as espécies, incluindo a nossa. 
Isso tudo, claro. Mas não por isso. 

Quero a revolução para voltar a música boa, o gingar da manhã e o sorriso do vizinho. 
O que torna tudo muito mais urgente.  

4 comentários:

  1. A última frase é que me resgatou totalmente!

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  2. Pode fazer a revolução no seu quintal. Fica feliz e não aborrece ninguém.

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  3. Como não tenho quintal, terei de fazê-la no seu. Acredito pela simpatia demonstrada Kruzes Kanhoto não só não se importará como ficará eternamente agradecido.

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